José Muñoz
#afeto#América Latin(o/a)#(inter)disciplinaridade#performativo#político#(pós/de)colonialismo#queer#raça#religião#vida cotidiana
Entrevista com José Muñoz (2002)
José Esteban Muñoz foi Professor de Estudos da Performance na New York University. Até a sua inesperada morte prematura em 2013, foi um teórico dos estudos da performance, da cultura visual, da teoria queer, dos estudos culturais e da teoria crítica. Concluiu sua graduação no Sarah Lawrence College e seu doutorado no Programa de Pós-Graduação em Literatura pela Duke University, onde estudou sob a tutela da teorista queer Eve Kosofsky Sedgwick. Escreveu sobre artistas, performers e figuras culturais importantes como Vaginal Davis, Nao Bustamante, Carmelita Tropicana, Isaac Julien, Kevin Aviance, James Schuyler e Andy Warhol. Seu livro Disidentifications: Queers of Color and the Performance of Politics (University of Minnesota Press, 1999) é um texto fundamental na crítica queer de cor e uma enorme contribuição para o estudo das minorias no campo dos estudos da performance. Também co-editou Pop Out: Queer Warhol (Duke University Press, 1996) com Jennifer Doyle e Jonathan Flatley, e Everynight Life: Culture and Dance in Latin/o America (Duke University Press, 1997) com Celeste Fraser Delgado. A editora New York University Press publicou seu mais recente livro Cruising Utopia: the Then and There of Queer Futurity, no outono de 2009.X
Diana Taylor: José Muñoz, bem vindo. Nós gostaríamos de apresentar José Muñoz, professor do departamento de Estudos da Performance na Tisch School of the Arts da NYU [New York University]. José, quais são os princípios básicos dos estudos da performance na sua opinião?
José Muñoz: Bem, você sabe que eu encaro os estudos da performance como um modo de análise, predominantemente ligado a teorias da performatividade e aos atos da fala da linguística. Portanto, estudos da performance organizados por um fazer, em oposição a uma perspectiva mais epistemológica – de um saber. Eu fiz pós-graduação num programa de literatura que tendia muito ao epistemológico. Tratava-se sempre do que podemos conhecer num texto ou do jogo infinito de interpretações. Os estudos da performance trouxeram algo que é extremamente importante para mim porque a preocupação está no que um texto faz, ou o que algo que não é textual – que é paratextual – faz no mundo: o que ele faz materialmente e politicamente. É isso que os estudos da performance fazem para mim.
Diana: Qual você diria ser sua contribuição aos estudos da performance — o modo como seus próprios interesses... o modo como você gostaria de usar esse campo na sua pesquisa acadêmica e em sala de aula?
José: Bom, uma das coisas que me atrai muito nos estudos da performance é que acaba sendo sempre já interdisciplinar, já aparece bebendo de várias fontes teóricas e de diferentes mapeamentos do mundo. Isso é muito útil. E, bem, no meu caso, eu... meu primeiro livro Muñoz, José Esteban. 1999. Disidentifications: queers of colors and the performance of politics. Minneapolis: University of Minesota Press. se concentrou nas performances antinormativas de pessoas de cor, de gays e lésbicas e outras minorias sexuais, e olhei especificamente para o trabalho que suas performances fazem no mundo. E no meu próximo projeto, de certa maneira, eu continuo pensando sobre isso mas com uma lente mais poderosa, já que me interessa mais os detalhes de como as pessoas fazem isso nas performances cotidianas — não só nas performances teatrais, nos espetáculos, mas em como elas fazem coisas na vida cotidiana ou mesmo em espaços de performance que estão entre o teatro e a vida cotidiana, como uma igreja, por exemplo. Parte de minha pesquisa tem me levado a igrejas no Lower East Side [de Nova York] e em Miami, e tenho observado diferentes performances de religiosidade — o corpo das pessoas, seus atos de fala, o tipo de êxtase religioso que os grupos e as pessoas experienciam. E eu tento pensar isso em relação ao lugar particular que essas pessoas ocupam num mapa sintonizado com o processo de globalização, e também pensar sobre a diferença de como alguns imigrantes e comunidades de exilados são desprivilegiados no capitalismo tardio dos EUA, e como se perde a conexão com um sentido de comunidade ou de lugar. E eles acham isso novamente através da religião ou desses espetáculos de religiosidade, como nessas igrejas. E está tudo bem, mas o ruído para mim aparece quando a direita estadunidense consegue aproveitar esses espetáculos de religiosidade e usar isso como poder eleitoral. E a conexão disso tudo com o que está acontecendo na América Latina atualmente, a descatolicização da América Latina e a nova conversão do protestantismo para um modo ultradireitista e ultraconservador de cristianismo, que foi, até onde eu percebo, fabricado nos EUA e exportado para lá.
“Os estudos da performance são determinados por um ‘fazer’, e não por uma perspectiva mais epistemológica – por um ‘saber’. Há uma coisa acerca dos estudos da performance que é extremamente útil para mim, porque refere-se mais ao que um texto faz no mundo, ao que ele faz política e materialmente.”
Diana: Então você está sugerindo que há, talvez, além do foco interdisciplinar, um foco internacional, que quando você olha para essas práticas de performance você quase por definição está olhando para uma formação que se dá através de fronteiras nacionais e étnicas. Está correto?
José: Sim, definitivamente no material com o qual trabalho e também nos projetos dos meus alunos. Mas também acho muito difícil pensar nos latinos dos EUA, por exemplo, sem pensar também na América Latina, em formações políticas particulares que desencadearam diferentes padrões de fluxo e migração e movimento. Ou seja, é difícil pensar na situação dos nuyoricans de Nova York sem pensar na condição colonial de Porto Rico. Seria difícil pensar sobre Miami e seu status de conglomerado da mídia sem pensar no capital do exílio cubano e em como ele funciona. Então há muitos exemplos de como não podemos dissociar as conexões. Elas são muito fortes.
Diana: Como o seu interesse de pesquisa afeta seu ensino? Qual a relação?
José: Ah, eu tenho a chance de ensinar aquilo que eu estou pesquisando — que é definitivamente uma das coisas que eu mais amo nesse meu trabalho. Recentemente eu dei uma disciplina sobre emoção e performance, na qual pude explorar diferentes recursos teóricos para pensar sobre sentimento, incluindo a fenomenologia, alguns momentos interessantes da psicologia, trabalhos históricos de gente como Dubois, e lá eu juntei o que vai se tornar o motor teórico desse projeto que estou desenvolvendo atualmente.
Diana: Ótimo, muito obrigada.
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