Mother Earth and Resource Extraction: Women Defending Land and Water

Antecedentes legais


O que é uma corporação?

As corporações, legalmente consideradas pessoas jurídicas, podem ser constituídas a partir da fusão de várias empresas e partes interessadas em uma única entidade. As corporações multinacionais são empresas incorporadas em um país, mas que produzem e/ou vendem seus produtos em outro país. As multinacionais (também chamadas de transnacionais) são responsáveis pela grande maioria das empresas de mineração em todo o mundo. Essas empresas freqüentemente operam por meio de subsidiárias, controladas pela empresa matriz. Enquanto a matriz pode exercer um controle significativo sobre a subsidiária, a lei canadense trata as duas como separadas e permite que uma empresa matriz estabeleça uma subsidiária com o único objetivo de evitar a responsabilidade legal.

Compreender a conexão legal (e distinção) entre uma empresa matriz e as ações de uma subsidiária é importante para compreender as complexidades legais do direito internacional no contexto do extrativismo. Existem atualmente processos em tribunais canadenses que poderiam estabelecer precedentes para agilizar este processo. Há um crescente consenso internacional sobre a responsabilidade das empresas-mãe por suas subsidiárias, mas a capacidade de regular essas empresas ainda não foi adequadamente desenvolvida.

O véu corporativo e a responsabilidade empresarial

O termo usado para descrever a proteção das empresas-mãe contra a responsabilidade legal é chamado de véu corporativo. Uma empresa com sede no Canadá pode criar uma subsidiária em um país estrangeiro onde deseja operar uma mina e ainda assim exercer total controle de supervisão sobre essa subsidiária. A lei no Canadá tratará as duas empresas (e suas ações) como completamente separadas, mesmo que a subsidiária exista apenas no papel. Uma subsidiária e uma matriz podem ter a mesma diretoria, a mesma equipe gerencial e ter exatamente os mesmos investimentos, mas os riscos operacionais estão ligados apenas a uma das entidades. Este é o véu corporativo. Isto significa que a lei distingue entre participação financeira e responsabilidade legal. No contexto canadense, esta lacuna de responsabilização limita diretamente o acesso à justiça para as vítimas de violações de direitos humanos e danos ambientais perpetrados pelas subsidiárias de empresas de mineração. Por meio de uma rede de empresas subsidiárias (e o véu corporativo), as empresas e seus acionistas podem se eximir legalmente da responsabilidade.

A cultura de uma empresa-mãe legalmente intocável com sede no Canadá e operando em um país estrangeiro impede o recurso legal para as vítimas. Isto é especialmente verdadeiro nos Estados-nação onde a capacidade de responsabilizar efetivamente os perpetradores é menor. O véu corporativo permite às empresas de mineração operar impunemente e perpetua um ciclo de violações dos direitos humanos.

A superação do véu corporativo nos tribunais canadenses é um processo jurídico complicado com resultados incertos para os litigantes. Teoricamente, se o véu corporativo for "trespassado", a empresa-mãe pode ser responsabilizada pelo comportamento de sua subsidiária. Na prática, porém, é extremamente difícil responsabilizer uma empresa-mãe na jurisprudência canadense. Devido a essa incerteza, uma estratégia que advogados têm usado para tentar responsabilizar as empresas-mãe por seus abusos no exterior é apontar suas responsabilidade direta pelos danos causados por suas subsidiárias através de alegações de violação do "dever de cuidado", mas isso ainda não aconteceu com sucesso no Canadá.

Em casos de violação de um dever de cuidado, uma matriz é considerada diretamente responsável em paralelo com sua subsidiária. Isto mantém as identidades separadas das empresas controladora e subsidiária, mas permite que uma empresa controladora seja considerada negligente, geralmente em conjunto com a subsidiária. Para evidenciar esta responsabilidade direta para a matriz, os advogados precisam argumentar que as empresas possuem um dever direto de cuidar das vítimas. Isto é uma obrigação de atenção razoável ao lidar com outros para evitar comportamentos imprudentes; no contexto das corporações multinacionais, isto significa provar que a negligência da matriz tornou possível que a subsidiária se comportasse de tal forma a permitir uma conduta prejudicial.

A responsabilidade indireta é mais difícil de estabelecer, pois os tribunais temem que os litigantes se aproveitem de um processo simples. Como as empresas-mãe são maiores e têm mais recursos financeiros, um litigante pode decidir estrategicamente quem levar ao tribunal independentemente dos fatos de um caso. Uma empresa controladora pode ser capaz de pagar uma compensação maior do que a subsidiária, mas ao criar mais obstáculos para a responsabilidade indireta, a idéia é que os litigantes se atenham aos detalhes do caso. O véu corporativo já foi trespassado no passado para atribuir responsabilidade civil, mas tomar esta direção é arriscado porque os tribunais não têm entendimentos universalmente aplicáveis da lei. Existem enormes inconsistências na interpretação da responsabilidade civil nas jurisdições de direito comum.


Conflito de leis

Outro fator complicador para responsabilizar as multinacionais é um conceito chamado "conflito de leis". O sujeito legal do conflito de leis refere-se à jurisdição - o local onde uma sentença deve ocorrer. O conflito de leis canadenses (na maioria das províncias) está enraizado na tradição da lei comum. Antes que um julgamento possa ocorrer, o tribunal deve determinar se o caso tem uma conexão real e substancial do caso com o local onde o tribunal está localizado (simplificador de jurisdição). O réu pode argumentar que mesmo que o tribunal determine que tem jurisdição, o tribunal deve ainda assim recusar ouvir o caso porque existe um foro mais apropriado (normalmente os tribunais da região/país onde o dano alegadamente ocorreu) que seria mais apropriado.

O fórum non conveniens permite que os tribunais possam negar provimento aos pedidos se outro foro for mais adequado para julgar o caso. A idéia por trás disto é impedir que os litigantes "comprem o fórum", isto é, que os litigantes escolham um tribunal em um lugar com leis que sejam as mais benéficas e não as mais apropriadas. Mesmo que o tribunal canadense possa estabelecer a autoridade legal para julgar (jurisdição) e estabelecer uma conexão real e substancial com o caso, a lei dá aos tribunais canadenses a capacidade de recusar o caso em favor do foro estrangeiro.

Direito Internacional

Em 2011, os Princípios Orientadores das Nações Unidas para Empresas e Direitos Humanos, também conhecidos como Princípios Ruggie, foram endossados por unanimidade pelo Conselho de Direitos Humanos da ONU. Esta iniciativa global delineou diretrizes para os Estados e empresas para prevenir e combater violações de direitos humanos cometidas em operações comerciais, industriais e extrativistas. Os três pilares da estrutura da ONU são: o dever do Estado de proteger os direitos humanos, a responsabilidade corporativa de respeitar os direitos humanos e o acesso a recursos. A ideia é que se deve trabalhar com base no conjunto de tais princípios para fortalecer os direitos humanos. Entretanto, o segundo pilar se baseia na autorregulamentação das multinacionais, ignorando que as empresas frequentemente priorizam os lucros em detrimento do respeito aos direitos humanos (em algumas jurisdições, suas responsabilidades legais para com os acionistas até mesmo as obrigam a fazê-lo). Como resultado, sem um tratado internacional vinculativo ou leis nacionais que exijam que as empresas adiram a estas diretrizes, na prática, os Princípios Ruggie são contraditórios e a adesão corporativa é, na melhor das hipóteses, uma aspiração.

Embora uma abordagem formal da lei internacional não leve em conta os atores não-estatais como sujeitos, entende-se que os atores não-estatais têm muito poder. Em reconhecimento a este poder, os Artigos da Comissão de Direito Internacional (ILC's) sobre Responsabilidade do Estado por Atos Errados Internacionalmente (ASRIWA) descrevem as formas pelas quais os Estados são considerados portadores de deveres diretos pelo comportamento vicário de atores privados. Isto reconhece ativamente o impacto que atores privados como as corporações multinacionais podem ter no cenário internacional.

Em um esforço para preencher a lacuna do direito relativo à responsabilidade de empresas no plano internacional que permite às corporações operar impunemente, a Resolução 26/9 do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, adotada em junho de 2014, estabeleceu um grupo de trabalho para desenvolver um tratado sobre empresas e direitos humanos. O que torna este tratado notável é que ele estabelece uma responsabilidade compartilhada entre os Estados e os atores privados para defender os direitos humanos. O grupo de trabalho intergovernamental foi presidido pelo Equador e realizou sessões em 2015, 2016, 2017, e em julho de 2018 foi apresentada uma Versão Zero. Em julho de 2019, a versão mais recente da minuta do tratado foi concluída; esta minuta formou a base das negociações para a reunião do Grupo de Trabalho Intergovernamental Aberto das Nações Unidas, que ocorreu de 14 a 18 de outubro de 2019. Uma minuta revisada está prevista para o final de fevereiro de 2020.

Nesta minuta, o Preâmbulo declara "todas as empresas comerciais, independentemente de seu tamanho, setor, contexto operacional, propriedade e estrutura, têm a responsabilidade de respeitar todos os direitos". O artigo 3 declara que o tratado se aplicaria a "todas as atividades comerciais, incluindo particularmente aquelas de caráter transnacional, mas não se limitando a elas". Além disso, o artigo 4.9 protege as pessoas vulneráveis:

Os Estados Partes devem tomar medidas adequadas e eficazes para garantir um ambiente seguro e favorável às pessoas, grupos e organizações que promovem e defendem os direitos humanos e o meio ambiente, para que possam agir livres de ameaças, restrições e insegurança.


Os acréscimos à última versão da minuta criam bastante espaço para o acesso a reparações. No contexto da extração de recursos, a parte mais notável do rascunho é o artigo 1.2, no qual se afirma que

Violação ou abuso dos direitos humanos" significa qualquer dano cometido por um Estado ou empresa comercial, através de atos ou omissões no contexto de atividades comerciais, contra qualquer pessoa ou grupo de pessoas, individual ou coletivamente, incluindo dano físico ou mental, sofrimento emocional, perda econômica ou prejuízo substancial de seus direitos humanos, incluindo direitos ambientais.


Infelizmente, a Versão Zero diferencia entre responsabilidade legal e obrigação legal de responder pelos danos causados, o que significa que esta versão deixa nas mãos dos Estados e de suas respectivas leis nacionais a obrigação de responder pelos danos e a função de cobrar para que a responsabilização aconteça. É preciso haver uma harmonização entre o direito internacional e as leis de nível nacional. O Canadá deve agir de acordo com isso, desenvolver ainda mais a CORE e introduzir legislação obrigatória.

Outros recursos

Estes instrumentos da ONU fornecem informações de base que conectam diretamente a responsabilidade corporativa aos direitos das mulheres:

Comitê das Nações Unidas para a Eliminação da Discriminação contra a Mulher, 2016. "Observações finais sobre o oitavo e nono relatórios periódicos combinados do Canadá".

Grupo de Trabalho das Nações Unidas sobre Empresas e Direitos Humanos, 2011. "Princípios Orientadores sobre Empresas e Direitos Humanos".

Grupo de Trabalho das Nações Unidas sobre Mineração e Direitos Humanos na América Latina, 2014. "O impacto da mineração canadense na América Latina e a responsabilidade do Canadá".
 

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