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What is Performance Studies?

Diana Taylor, Author

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Atos de Transferência


Atos de Transferência

Diana Taylor, New York University

Do livro O arquivo e o repertório. Traduzido por Eliana Lourenço de Lima Reis. Belo Horizonte: UFMG.


As performances funcionam como atos de transferência vitais, transmitindo o conhecimento, a memória e um sentido de identidade social por meio do que Richard Schechner denomina “comportamento reiterado”.[3]  Em um primeiro nível, a performance constitui o objeto/processo de análise nos estudos da performance, isto é, as muitas práticas e eventos – dança, teatro, ritual, comícios políticos, funerais – que envolvem comportamentos teatrais, ensaiados ou convencionais/apropriados para a ocasião. Essas práticas são geralmente separadas de outras à sua volta para constituir focos de análise distintos. Algumas vezes, esse enquadramento faz parte do próprio evento – determinada dança ou comício têm começo e fim; não afluem, de modo contínuo ou sem divisões, para dentro de outras formas de expressão cultural.  Dizer que algo é uma performance significa fazer uma afirmação ontológica, embora localizada. O que uma sociedade considera uma performance poderia ser considerado um não evento em outra.


Em um segundo nível, a performance também constitui a lente metodológica que permite que pesquisadores analisem eventos como performances.[4]  Obediência cívica, resistência, cidadania, gênero, etnicidade e identidade sexual, por exemplo, são ensaiados e performatizados diariamente na esfera pública. Entender esses itens como performances sugere que a performance também funciona como uma epistemologia. A prática incorporada, juntamente com outras práticas culturais associada a elas, oferece uma maneira de conhecer. A qualidade parentética dessas performances é externa, ela vem da lente metodológica que as organiza como uma 'totalidade' analizável. A performance e a estética da vida cotidiana variam de comunidade para comunidade, refletindo a especificidade cultural e histórica existentes tanto na encenação quanto na recepção. (Enquanto a recepção se modifica tanto na performance ao vivo quanto naquela mediada tecnologicamente, apenas na performance ao vivo o ato em si se modifica). As performances viajam, desafiando e influenciando outras performances. Contudo, elas estão, em certo sentido, sempre in situ: são inteligíveis na estrutura do ambiente imediato e das questões que as rodeiam. O é/como realça a compreensão da performance como simultaneamente “real” e “construída,” como um conjunto de práticas que reúnem o que historicamente ficou separado como discursos ontológicos e epistemológicos distintos, supostamente autônomos.

Os muitos usos da palavra performance apontam para as complexas camadas de referencialidade, aparentemente contraditórias, que às vezes se sustentam mutuamente. Victor Turner toma como base para seu entendimento do termo a raiz etimológica francesa, parfournir, “fornecer”, “‘completar’ ou ‘executar completamente’”.[5] Do francês, o termo passou para o inglês como performance no século XVI e, desde os séculos XVI e XVII, tem sido usado com o sentido que tem hoje.[6]  Para Turner, ao  escrever nas décadas de 1960 e 1970, as performances revelavam o caráter mais profundo, mais verdadeiro e mais individual da cultura. Guiado por uma crença na sua universalidade e relativa transparência, Turner afirmava que as populações poderiam aprender a compreender umas às outras por meio de suas performances.[7]  Para outros, evidentemente, a performance significa justamente o oposto: o caráter construído das performances sinalizam  sua artificialidade – a performance é algo “simulado”, antitético ao “real” e “verdadeiro.” Em alguns casos, a ênfase no caráter construído da performance revela um preconceito antiteatral; em leituras mais complexas, o construído é reconhecido como vizinho do real. Embora uma dança, um ritual ou uma manifestação exijam uma separação ou um enquadramento que os diferenciem de outras práticas sociais à sua volta, isso não implica que a performance não seja real ou verdadeira. Ao contrário, a idéia de que a performance distila uma verdade “mais verdadeira” do que a própria vida vem desde Aristóteles, passando por Shakespeare, Calderón de La Barca, Artaud e Grotowski, e chegando até o presente. No campo dos negócios, o termo é usado com mais frequência do que em qualquer outro, embora geralmente com sentido diferente, isto é, para indicar que alguém ou, mais frequentemente, alguma coisa põe em prática todo seu potencial. Os supervisores avaliam a eficácia dos trabalhadores em seu emprego, sua performance, como se fossem carros ou computadores, e parece que os mercados competem para ter uma performance melhor do que seus rivais. Perform or else  (Tenha uma boa performance, ou então...), o título do livro de Jon McKenzie, capta muito bem o imperativo de alcançar os padrões de negócios (e culturais). Os consultores políticos entendem que a performance como estilo – ao invés de no sentido de levar a cabo ou completar com êxito –   frequentemente determina o resultado político. A ciência também começou a explorar o comportamento humano reiterado e a cultura expressiva através de memes: “Memes são histórias, canções, hábitos, habilidades, invenções e maneiras de fazer as coisas que copiamos de pessoa para pessoa por meio da imitação” – em suma, os atos reiterativos que venho chamando de performance, embora, é claro, a performance não envolva necessariamente comportamentos miméticos.[8]

Nos estudos da performance, portanto, as noções sobre a definição, o papel e a função da performance variam muito. A performance sempre diz respeito apenas à incorporação? Ou ela questiona os próprios contornos do corpo, desafiando noções tradicionais de incorporação?  Desde os tempos antigos, a performance tem manipulado, ampliado e brincado com a incorporação – essa intensa experimentação não começou com Laurie Anderson. As tecnologias digitais vão nos convidar, mais e mais, a reformular nossa compreensão da “presença,” do lugar (agora o “sítio” on-line, não localizável), o efêmero e a incorporação. Os debates proliferam.

Um exemplo do âmbito desta compreensão é o debate sobre a capacidade de permanência da performance. Partindo de uma posição lacaniana, Peggy Phelan delimita a vida da performance ao presente: “a performance não pode ser salva, gravada, documentada ou participar de outro modo da circulação de representações da representação. (...) O ser da performance, como a ontologia da subjetividade proposta aqui, torna-se ela mesma por meio do desaparecimento.”[9]  Joseph Roach, por outro lado, amplia o entendimento da performance ao colocá-la ao lado da memória e da história. Assim, ela participa da transferência e da continuidade do conhecimento: “As genealogias da performance trazem consigo a idéia de movimentos expressivos como reservas mnemônicas, incluindo movimentos padronizados feitos e lembrados por corpos, movimentos residuais guardados implicitamente em imagens ou palavras (ou nos silêncios entre eles) e movimentos imaginários sonhados em mentes, não anteriormente à linguagem, mas como partes constitutivas dela.”[10]  Os debates sobre o caráter efêmero da performance são, evidentemente, profundamente políticos. De quem são as memórias, tradições e reivindicações à história que desaparecem se falta às práticas performáticas o poder de permanência para transmitir conhecimento vital?

Pesquisadores vindos da filosofia e da retórica (como J. L. Austin, Jacques Derrida e Judith Butler) criaram termos como performativo e performatividade. O performativo, para Austin, refere-se a casos em que “a emissão de um enunciado [utterance] é também a realização de uma ação.”[11]  Em alguns casos, a reiteração e o  processo de enquadramento que associei com a performance anteriormente são claros: é dentro da estrutura convencional de uma cerimônia de casamento que a palavra “sim” contém peso legal.[12]  Outros continuaram a desenvolver a noção de performativo de maneiras diversas. Derrida, por exemplo, vai mais além ao enfatizar a importância do aspecto citacional e iterativo do “evento de fala,” questionando a idéia de que “uma declaração performativa é bem sucedida se sua formulação não repetiu uma declaração ‘codificada’ ou iterável.”[13]  Entretanto, o enquadramento que sustenta o uso, feito por Butler, de performatividade – o processo de socialização por meio do qual as identidades de gênero e de sexo (por exemplo) são produzidas mediante práticas regulatórias e citacionais – é mais difícil de identificar, pois a normalização tornou-a invisível. Enquanto em Austin o performativo aponta para a língua que age, em Butler o performativo segue na direção oposta, subsumindo a subjetividade e a agência cultural na prática discursiva normativa. Nessa trajetória, o performativo se torna menos uma qualidade (ou adjetivo) de “performance” do que do discurso. Embora possa ser tarde demais para trazer de volta o performativo para o reino não discursivo da performance, sugiro que se tome emprestada uma palavra do uso contemporâneo de performance em espanhol – performático – para denotar a forma adjetiva do reino não discursivo da performance. Por que isso é importante? Porque é vital sinalizar que os campos performático, digital e visual são separados (apesar de estarem sempre enredados entre si) do campo discursivo, tão privilegiado pelo logocentrismo ocidental. O fato de não termos uma palavra em inglês para sinalizar esse espaço performático é um produto daquele mesmo logocentrismo, e não uma confirmação de que nada existe ali.[14] 

Portanto, um dos problemas de se usar a performance, bem como seus falsos cognatos “performativo” e “performatividade,” vem do âmbito extraordinariamente amplo de comportamentos abrangidos pelo termo,  que vão desde uma determinada dança até a performance mediada tecnologicamente ou o comportamento cultural convencional. Contudo, o fato de a performance ter camadas múltiplas indica as interconexões profundas entre todos esses sistemas de inteligibilidade e as fricções produtivas entre eles. Como os usos diferentes do termo/conceito – acadêmicos, políticos, científicos e relacionados a negócios – raramente se envolvem de modo direto, a performance tem também uma história de intraduzibilidade. Ironicamente, a própria palavra ficou trancada dentro das caixas disciplinares e geográficas que ela desafia; também teve negada a universalidade e a transparência que, para alguns, ela prometeria a seus focos de análise. Evidentemente, esses muitos pontos de intraduzibilidade são o que torna o termo e as práticas capacitados teoricamente e reveladores culturalmente. As performances não podem, como Turner esperava, nos dar acesso a outra cultura, permitindo vê-la em profundidade, mas elas certamente nos dizem muito sobre nosso desejo  desse acesso e refletem a política de nossas interpretações.

Parte desta indefinibilidade caracteriza os estudos da performance como campo de pesquisa. Na época de seu aparecimento, nos anos 1970, como produto dos levantes sociais e disciplinares que, no final da década de 1960, sacudiram a academia, os estudos da performance buscavam atenuar as divisões disciplinares entre a Antropologia e o teatro, encarando os dramas sociais, a liminaridade e a encenação como formas de escapar das noções estruturalistas de normatividade. Os estudos da performance – que, como já indiquei, não têm apenas um significado – claramente surgiram dessas disciplinas, mesmo rejeitando suas fronteiras. Ao fazer isso, os estudos da performance herdaram alguns dos pressupostos e pontos cegos dos estudos do teatro e da Antropologia, mesmo quando procuravam transcender a formação ideológica destes. Contudo, é igualmente importante ter em mente que a Antropologia e os estudos do teatro eram (e são) compostos de variadas correntes, muitas vezes em conflito. Neste momento posso apenas oferecer alguns exemplos rápidos de como algumas dessas preocupações disciplinares e limitações metodológicas foram transferidas para o pensamento sobre a performance.

Da Antropologia dos anos 1970 os estudos da performance herdaram seu rompimento radical com as noções de comportamento normativo promulgadas pelo sociólogo Emile Durkheim, que afirmava que a condição social dos humanos (e não a agência individual) é responsável por comportamentos e crenças.[15]  Os que discordavam dessa posição estruturalista defendiam que a cultura não era algo gratuito e reificado, mas uma arena de disputa social em que os atores sociais se juntavam para lutar pela sobrevivência. A partir da ala comumente denominada “dramatúrgica,” antropólogos como Turner, Milton Singer, Erving Goffman e Clifford Geertz começaram a escrever sobre os indivíduos como agentes em seus próprios dramas. As normas, eles argumentavam, são contestadas e não apenas aplicadas. A análise de encenações tornou-se crucial no estabelecimento de reivindicações de agência cultural. Os humanos não se adaptam simplesmente aos sistemas. Eles os formam. Como reconhecer elementos, tais como escolha, opção pelo momento adequado e autoapresentação, a não ser por meio das maneiras  como que indivíduos e grupos os performatizam? O modelo dramatúrgico também salientava os componentes estéticos e lúdicos dos eventos sociais, bem como o caráter intervalar da liminaridade e da inversão simbólica.

Participando da corrente linguística, antropólogos como Dell Hymes, Richard Bauman, Charles Briggs, Gregory Bateson e Michelle Rosaldo foram influenciados por pensadores como J. L. Austin, John Searle e Ferdinand de Saussure, que focalizavam a função performativa da comunicação – a parole, nos termos de Saussure.[16]  Novamente, assim como aconteceu com o modelo dramatúrgico, o modelo linguístico enfatizava a agência cultural em funcionamento no uso da língua. Como, nos termos propostos pelo título da obra de Austin, faziam-se coisas com as palavras? Da mesma forma que o modelo dramatúrgico, este também enfatizava a criatividade em jogo no uso da língua, já que os falantes e suas audiências trabalhavam juntos para produzir performances verbais bem-sucedidas. A corrente linguística também investia no reconhecimento da criatividade na vida cotidiana de outros povos, maneiras de usar a linguagem que eram engenhosas, específicas e “autênticas.”  

Enquanto os pesquisadores da performance adotaram prontamente o projeto de levar a sério as encenações incorporadas, vistas  como uma maneira de entender como as pessoas gerenciam suas vidas, absorveram também o posicionamento ocidental da Antropologia, que continuava a lutar com sua herança colonial. O “nós” que estuda e escreve sobre “eles” era, evidentemente, parte de um projeto colonialista do qual provinha a Antropologia. Contudo, os pesquisadores que trabalhavam na década de 1970  buscavam romper o paradigma que fetichizava o local, negava agência aos povos que estudavam e os excluía da circulação do conhecimento criado sobre eles. Apesar disso, a comunicação, na maior parte dos casos, continuava a ser unidirecional. “Eles” não tinham acesso à “nossa” escrita. Essa prática de escrita de mão única revelava a ambivalência contínua em relação à dúvida sobre se “eles” ocupavam um mundo diferente – no espaço e no tempo – e se nós somos inter-relacionados e coevos. A unidirecionalidade da criação de sentido e da comunicação, por um lado, também provinha do privilégio dado, há séculos, ao escrito em relação ao conhecimento incorporado e, por outro, o refletia. Além disso, pouco se pensava sobre as muitas maneiras como o contato com o “não ocidental” havia, durante séculos, moldado a própria noção de identidade “ocidental.” Alguns antropólogos e pesquisadores do teatro estavam profundamente influenciados pelo impulso modernista de procurar a expressão autêntica, “primitiva” e, de algum modo, mais pura da condição humana nas sociedades não ocidentais. As tentativas feitas na literatura dos anos 1970 para ilustrar que esses “outros” eram de fato completamente humanos, com práticas de performance tão significativas quanto as “nossas,” traem a ansiedade produzida pelo colonialismo sobre o status dos sujeitos não ocidentais.

Apesar dos sentimentos descolonizantes de muitos antropólogos da década de 1970, as estruturas de explicação que usavam eram decididamente ocidentais. Voltando a Turner – a influência mais direta sobre os estudos da performance devido à associação produtiva deste antropólogo com Richard Schechner – fica claro que, embora o conceito de drama social tenha sido fundamental para os estudos da performance, as afirmações universalistas que ele faz sobre a ubiquidade do conceito se ressentem do filtro bastante estreito que usa para compreendê-lo: o drama aristotélico. Segundo Turner, “Ninguém poderia deixar de notar a analogia, na verdade a homologia, entre aquelas sequências de eventos supostamente ‘espontâneos’, que tornam totalmente evidentes as tensões existentes naquelas duas vilas, e a ‘forma  processual’ característica do drama ocidental, desde Aristóteles, ou do épico e da saga ocidentais, embora em uma escala limitada ou em miniatura.” Ninguém deixaria de notar, isto é, exceto aqueles que participavam dos eventos sem a menor noção desses paradigmas.[17]  Como que para se prevenir de uma acusação, já percebida, de eurocentrismo, Turner completa: O fato de que um drama social (...) corresponde de perto à descrição da tragédia por Aristóteles na Poética, de que ela é “completa e inteira, e de uma certa magnitude (...) possuindo um começo, um meio e um fim,” não acontece, repito, porque tentei de modo inapropriado impor um modelo “ético” ocidental de ação no palco à conduta da sociedade de uma aldeia africana, mas porque existe uma relação interdependente, talvez dialética, entre os dramas sociais e gêneros de performance cultural em todas as sociedades.” (p. 72) Novamente, as teorias de Turner sobre acontecimentos estruturados com começo, meio e fim reconhecíveis podem ter menos a ver com os acontecimentos “supostamente ‘espontâneos’” do que com sua lente analítica. A lente, para ele como para qualquer um, revela seus (nossos) desejos e interesses. Ele pode estar correto ao notar a interdependência das performances sociais e culturais no interior de uma sociedade específica, mas seria importante questionar se, e como, essa interdependência poderia  atravessar as culturas. Além disso, sua postura de observador “objetivo”, que olha de uma posição superior o “objeto” de análise, cria a perspectiva desigual e distorcida que resulta no gesto duplo que caracteriza muito da escrita sobre práticas de performance em contextos diferentes do nosso. Primeiro, o observador declara reconhecer o que está acontecendo na performance do Outro, ou sobre o Outro. De algum modo, esse acontecimento é reificado e interpretado por meio de um paradigma ocidental preexistente. Segundo, o reconhecimento é seguido por uma afronta: essa performance se mostra como uma versão “em miniatura” ou diminuída do “original.”

Dos estudos de teatro – a parceira “materna”, de acordo com a Turner (p. 9) – os estudos da performance herdam outra forma de radicalismo: sua propensão à vanguarda, que valoriza a originalidade, o transgressivo e, novamente, o “autêntico.” Esta é uma operação diferente, mas complementar: o não ocidental é a matéria prima a ser retrabalhada e tornada “original” no Ocidente. Presume-se, evidentemente, que a performance – agora entendida como prática inspirada fortemente nas artes visuais e em representações teatrais não convencionais, happenings, instalações, body art e performance art – é uma prática estética com raízes, por um lado, no surrealismo e dadaísmo e, por outro, em tradições performáticas mais antigas como o cabaré, o jornal vivo e os rituais de cura e possessão. A ênfase da vanguarda na originalidade, no efêmero e no novo esconde múltiplas tradições ricas e antigas de prática performática. Em 1969, por exemplo, Michael Kirby, membro fundador do Departamento de Estudos da Performance na NYU, criado logo depois, afirmou que “o teatro ambiental é um desenvolvimento recente,” associado com a vanguarda, embora ele reconheça que, desde o teatro grego, existem produções poderiam receber esse mesmo rótulo. É o “elemento estético específico” que, para Kirby, o diferencia de formas anteriores.[18]  Contudo, sua ênfase na estética não consegue, na verdade, distinguir os exemplos recentes dos anteriores. Frei Motolinía, um dos primeiros doze franciscanos a alcançar as Américas no século XVI, descreve uma celebração de Corpus Christi em 1538 durante a qual participantes nativos de Tlaxcala criaram elaboradas plataformas externas, “todas de ouro e trabalhos com penas,” bem como montanhas e florestas inteiras povoadas com animais vivos ou artificiais, que eram “uma coisa maravilhosa de se ver”, e por onde os espectadores/participantes andavam para alcançar um efeito “natural.”[19]  Afirmações como a proposta por Kirby no final da década de 1960 constituem a epítome da obsessão autoconsciente pelo novo, comum naquele período,  ao mesmo tempo em que se esquecia ou ignorava o que já existia. Esses tipos de afirmação incitaram acusações de que o campo nascente dos estudos da performance era a-histórico ou até mesmo anti-histórico.

[....]

Apesar de serem a-históricos em parte de sua prática, nada há de inerentemente a-histórico ou ocidental nos estudos da performance. Nossas metodologias podem, e devem, ser revisadas constantemente por meio do encontro com outros interlocutores, bem como com outras realidades regionais, raciais, políticas e linguísticas, tanto dentro, quanto além, de nossas fronteiras nacionais. Isso não significa estender nossos paradigmas atuais para incluir outras formas de produção cultural. Também não justifica limitar nosso âmbito de interlocutores àqueles cujas histórias de vida e habilidades linguísticas se parecem com as nossas. O que estou propondo é um empenho e um diálogo ativos, apesar de complicado. A performance existe desde que existem pessoas, embora o campo de estudo em sua forma atual  seja relativamente recente. Os estudos da performance surgiram na cena acadêmica com uma bagagem herdada e vêm tentando, há muito tempo, superar – muitas vezes com sucesso – algumas dessas limitações. O eurocentrismo e o esteticismo de parte dos estudos sobre o teatro, por exemplo, entram em conflito com o fato de que tradicionalmente a Antropologia focaliza práticas não ocidentais como sistemas criadores de sentido. A crença de antropólogos como Geertz de que “fazer etnografia é como procurar ler (...) um manuscrito – estrangeiro, descolorido, cheio de elipses” e de que a cultura é um “documento performatizado” vai contra os princípios dos Estudos da Performance, que insistem na participação e reação ativas de todos.[22]  Estamos todos presentes nesse quadro, somos todos atores sociais em nossos dramas sobrepostos, limítrofes, litigiosos. Até mesmo o distanciamento de Brecht se apóia na ideia de que os espectadores estão fortemente ligados aos acontecimentos no palco, não por meio da identificação, mas da participação, e de que eles são frequentemente chamados a intervir e mudar o curso da ação.

Na América Latina, onde o termo não encontra um equivalente satisfatório no espanhol e no português, em geral se refere a performance como arte performática (performance art). Traduzida simplesmente, mas de modo ambíguo, para o espanhol como el performance ou la performance, um travestismo linguístico que convida os falantes de inglês a pensar na performance de sexo/gênero, a palavra está começando a ser usada mais amplamente para se referir aos dramas sociais e às práticas incorporadas.[23]  É comum se referir atualmente a lo performático como o que se relaciona à performance em seu sentido mais amplo. Apesar das críticas de que performance é um termo inglês e de que não há uma maneira de fazer com que se torne confortável de pronunciar em espanhol ou português, pesquisadores e profissionais estão começando a apreciar as qualidades multivocais e estratégicas do termo. Embora a palavra possa ser vista como estrangeira e intraduzível, os debates, determinações e estratégias vindos das muitas tradições de práticas incorporadas e conhecimento corpóreo estão, nas Américas,  profundamente enraizados e prontos para a luta. Contudo, a linguagem que se refere a esses conhecimentos corpóreos mantém uma ligação firme com as tradições teatrais. A performance inclui qualquer dos seguintes termos usados para substituí-la (sem se reduzir a eles): teatralidad, espectáculo, acción, representación.

Teatralidad e espetáculo, assim como teatralidade e espetáculo, captam o sentido construído e abrangente da performance. As muitas maneiras como a vida social e o comportamento humano podem ser vistos como performance estão presentes nesses termos, embora com valor específico. A teatralidade, para mim, comporta um roteiro, uma configuração paradigmática que conta com participantes supostamente ao vivo, estruturados ao redor de um enredo esquemático, com um fim pretendido (apesar de adaptável). Seria possível dizer que toda a escrita do século XVI sobre o descobrimento e a conquista reencena o que Michel de Certeau denomina a “cena inaugural: depois de um momento de pasmo, nesse umbral pontilhado de colunatas de árvores, o conquistador escreverá o corpo do outro e traçará ali sua própria história.”[24]  A teatralidade torna o roteiro vivo e irresistível. Em outras palavras, os roteiros existem como imaginários específicos culturalmente – conjuntos de possibilidades, maneiras de conceber o conflito, a crise ou a resolução – ativados com maior ou menor teatralidade. Diferentemente do tropo, que é uma figura de linguagem, a teatralidade não se baseia na língua para transmitir um padrão estabelecido de comportamento ou de ação. [25]  O “encontro” colonial é um roteiro teatral estruturado de maneira previsível, como que uma fórmula, daí ser facilmente repetível. A teatralidade, como o teatro, ostenta seu artifício, seu caráter construído. Não importa quem reencena o encontro colonial da perspectiva do Ocidente – o romancista, o dramaturgo ou o funcionário do governo – no elenco estão sempre o mesmo protagonista-sujeito masculino e o mesmo “objeto” encontrado, de pele escura. A teatralidade luta pela eficácia, não pela autenticidade. Ela conota uma dimensão consciente, controlada e, portanto, sempre política, que a performance não precisa conter. A teatralidade difere do espetáculo por ressaltar a mecânica do espetáculo. Concordo com Guy Debord, que afirma que o espetáculo não é uma imagem, mas uma série de relações sociais mediadas pelas imagens. Portanto, como aponto em outro texto, o espetáculo “liga os indivíduos a uma economia de aparências e de olhar” que pode parecer mais invisivelmente normalizadora, isto é, menos “teatral”.[26]  Ambos os termos, entretanto, são substantivos sem verbo; assim, eles não deixam espaço para a agência cultural individual como faz a performance. Perde-se muito, em minha opinião, quando abrimos mão do potencial para a intervenção direta e ativa ao adotar palavras como teatralidade ou espetáculo em lugar do termo performance.

Palavras como acción e representación abrem espaço para a ação e intervenção individuais. Acción pode ser definida como um ato, um happening de vanguarda, uma manifestação ou intervenção política, como, por exemplo, os protestos em forma de teatro de rua encenados pelo grupo de teatro Yuyachkani, do Peru ou os escraches ou atos de execração pública contra torturadores por H.I.J.O.S, a organização de direitos humanos composta por filhos dos desaparecidos na Argentina. Dessa forma, a acción reúne tanto as dimensõesestéticas quanto as políticas da performance. Porém, os mandatos econômicos e sociais que pressionam os indivíduos a performatizar de acordo com certos modos normativos desaparecem – a maneira como performatizamos  nosso gênero, etnicidade e assim por diante. O termo acción parece mais dirigido e intencional e, portanto, menos imbricado social e politicamente do que performatizar, que evoca tanto a proibição quanto o potencial para a transgressão. Podemos, por exemplo, performatizar, ao mesmo tempo,  múltiplos papeis construídos socialmente, mesmo enquanto nos ocupamos de uma acción antimilitar claramente definida. A representação, mesmo com seu verbo representar, invoca noções de mimese, de uma quebra entre o “real” e sua representação, que os termos performance e performatizar  tornam mais produtivamente complicados. Embora esses termos tenham sido propostos, ao invés da performance, de som estrangeiro, eles também derivam de línguas, histórias culturais e ideologias ocidentais.

Por que, então, não usar um termo vindo de uma das línguas não européias, como o nauatle, o quéchua, o aimara ou qualquer uma das centenas de línguas indígenas ainda faladas nas Américas? Olin, que significa movimento em nauatle, parece um candidato possível. Olin é o motor por trás de tudo que acontece na vida, o movimento repetido do sol, das estrelas, da terra e dos elementos. Olin, que também significa “hule” ou borracha, era aplicado nas vítimas sacrificiais para facilitar a transição do reino terrestre para o divino. Além disso, Olin é um mês no calendário mexica e, assim, permite a especificidade temporal e histórica. Olin também se manifesta como uma divindade que intervém em questões sociais. O termo capta simultaneamente a natureza mais ampla e abrangente da performance como processo reiterativo e de ajuda, bem como seu potencial para a especificidade histórica, para a transição e a agência cultural e individual. Também poderíamos, talvez, adotar areito, termo que designa música e dança. Areitos, do arauaque aririn, era usado pelos conquistadores para descrever um ato coletivo que envolvia canto, dança, celebração e culto, que reivindicava legitimidade não só estética, mas também sociopolítica e religiosa. O termo me atrai porque embaralha todas as noções aristotélicas de gêneros, públicos e fins desenvolvidos distintamente. Ele reflete claramente a suposição de que as manifestações culturais excedem a compartimentalização, seja ela por gênero (música-dança) ou por participantes/atores, seja pelo efeito pretendido (religioso, sociopolítico, estético) em que se baseia o pensamento cultural ocidental. Ele também questiona nossas taxonomias, mesmo ao apontar para novas possibilidades interpretativas.

Sendo assim, por que não? Creio que, neste caso, substituir uma palavra com uma história reconhecível, embora problemática – como a performance – por outra desenvolvida em um contexto diferente, para sinalizar uma visão de mundo profundamente diferente, seria apenas um ato de racionalização dos desejos, uma aspiração a esquecer nossa história compartilhada de relações de poder e de dominação cultural que não desapareceria, mesmo que mudássemos nossa língua. A performance, como termo teórico e não como objeto ou prática, é nova nesse campo. Embora surgida nos Estados Unidos, em uma época de mudanças disciplinares, para fazer frente a áreas de análise que, anteriormente, excediam as fronteiras acadêmicas (isto é, “a estética da vida cotidiana”), a performance não está, como o teatro, sob o peso de séculos de atividade evangélica colonial ou normalizadora. Considero tranquilizadoras até mesmo sua própria indefinibilidade e complexidade. A performance traz consigo a possibilidade de desafio, até mesmo de autodesafio. Como termo que conota, simultaneamente, um processo, uma práxis, uma episteme, um modo de transmissão, uma realização e um modo de intervir no mundo, a performance excede, em muito, as possibilidades dessas outras palavras oferecidas em seu lugar. Além disso, o problema da intraduzibilidade, em minha opinião, é na verdade positivo, uma pedra no caminho que nos lembra que “nós” – seja em nossas várias disciplinas, línguas ou situações geográficas por todas as Américas – não nos compreendemos uns aos outros de modo simples ou não problemático. Proponho que se parta desta premissa – que não nos compreendemos uns aos outros – e se reconheça que cada esforço nesta direção precisa trabalhar com noções como acesso fácil, decifrabilidade e traduzibilidade. Essa pedra no caminho constitui um entrave não apenas para os falantes de espanhol e português que se deparam com uma palavra estrangeira, mas também para falantes de inglês que pensavam saber o que significava performance.





Notas

***As notas 1 – 2 não estão incluídas neste excerto.

[3] Richard Schechner, Between Theater and Anthropology, Philadelphia: University of Pennsylvania P, 1985, p. 36. Devo o termo "atos de transferência" a Paul Connerton, que o utiliza em seu excelente livro How Societies Remember, Cambridge: Cambridge University Press, 1989, p. 39.

[4]  A distinção "as/is" [como/é] é feita por Richard Schechner em Performance Studies: An Introduction, London, Routledge, 2002, p. 30–32. No entanto, discordo dele quanto à sua ideia de que o "é" reflete uma ontologia. Para Schechner, "a performance não é nada mais que ontológica. (...) Ela é totalmente construída socialmente" (em correspondência pessoal). Acho a tensão entre o ontológico e o construído mais ambígua e construtiva, realçando a compreensão dos pesquisadores desse campo de que a performance é tanto "real" quanto "construída".

[5]  A etimologia de 'performance' pode nos dar uma sugestão útil, pois ela não tem nada a ver com 'forma', mas deriva do francês parfournir, 'completar' ou 'realizar completamente'." Victor Turner, From Ritual to Theatre: The Human Seriousness of Play, New York, Performing Arts Journal Publications, 1982, p. 13.

[6] The Barnhart Diccionary of Etymology afirma que Steele, escrevendo no jornal Tatler, em 1709, usou o termo 'no sentido de uma exibição ou entretenimento público' e, em 1711, para se referir a 'aquele que performa' Robert K. Barnhart, The Barnhart Diccionary of Etymology, New York, H. W. Wilson, 1988, p. 777.

[7]  “Vamos nos conhecer uns aos outros melhor ao entrar nas performances um do outro e aprender suas gramáticas e vocabulários." Turner, From a Planning Meeting for the World Conference on Ritual and Performance, apud Richard Schechner y Willa Appel, Ed., By Means of Performance, New York, Cambridge University Press, 1990, p. i.

[8] Susan Blackmore, The Power of Memes, Scientific American, p. 65, 2000.

[9]  Peggy Phelan, Unmarked: The politics of Performance, London, New York, Routledge, 1993, p. 146.

[10] Joseph Roach, Cities of the Dead: Circum-Atlantic Performance, New York, Columbia University Press, 1996, p. 26.

[11] J. L. Austin, How To do Things With Words, 2. ed., Cambridge, MA, Harvard University Press, 1975, p. 6.

[12] Como disse Jacques Derrida ao escrever sobre a noção de performativo em Austin: "Poderia uma elocução performativa ser bem-sucedida se sua formulação não repetisse uma elocução 'codificada' ou iterável?" Jacques Derrida, Margins of Philosophy, trans. Alan Bass, Chicago: University of Chicago, 1982.

[13] Ibidem, p. 326.

[14] Esta é uma alusão a uma frase famosa de Gertrude Stein – "There is no there there" –, em Everybody's Autobiography, sobre a experiência de não conseguir encontrar a casa onde passara a infância, em Oakland, Califórnia, em uma de suas visitas aos Estados Unidos. [N.T.]

[15] Ver, por exemplo, Émile Durkheim, The Elementary Forms of the Religious Life, New York, Free Press, 1915.

[16] Ver: John Searle: What is a Speech Act, in Max Black, Ed., Philosophy in America, Ithaca, Cornell University Press, 1965; Dell Hymes, Breakthrough into Performance, in D. Ben-Amos and K. S. Goldstein, Ed., Folklore, Performance and Communication, Hague, Mouton, 1975; Dell Hymes, The Ethnography of Speaking, in T. Gladwin and W. Sturtevant, Anthropology and Human Behavior, Washington, Anthropological Society of Washington, 1982; Richard Bauman, Verbal Art as Performance, Rowley, MA, Newbury House, 1977; Charles Briggs, Competence in Performance, Philadelphia, University of Pennsylvania Press, 1988; Michele Rosaldo, The Things We Do with Words, Language in Society, v. 11, p. 203–35, 1982. Agradeço a Faye Ginsburg e Fred Myers por terem auxiliado a classificar as várias correntes da antropologia que lidam com performance e performatividade. Agradeço também a Aaron Glass, cujo manuscrito não publicado, “Performance and Performativity: Cultural and Linguistic Models” (junho de 2002), contribuiu para esclarecer algumas das influências nessas correntes. 

[17]  Turner, From Ritual to Theatre, p. 9.

[18] Michael Kirby, Environmental Theatre, in E. T. Kirby, Ed., Total Theatre, New York, Dutton, 1969, p. 265.

[19]  “Eles tinham algo muito surpreendente. Em cada uma das quatro esquinas ou voltas que a estrada fazia, estava construída uma montanha e de cada montanha subia um penhasco alto. A parte mais baixa era feita como um prado, com moitas de ervas e flores e tudo mais que há em um campo viçoso; a montanha e o penhasco eram tão naturais como se tivessem crescido ali. Era uma coisa maravilhosa de ver, pois havia muitas árvores: árvores silvestres, árvores frutíferas e árvores de flores, e cogumelos e fundos e o líquen que cresce nas árvores da floresta e em pedras. Havia até velhas árvores quebradas; em um lugar era como uma mata espessa e em outro era mais aberto. Nas árvores havia muitos pássaros, tanto grandes quanto pequenos: falcões, corvos, corujas; e na mata, muita caça; havia veados, lebres, coelhos, coiotes e um número grande de cobras. Estas últimas eram amarradas e suas presas, retiradas, pois a maioria delas era do gênero víbora, uma légua de comprimento e tão grossas como o braço de um homem na axila. (...) A fim de que nada pudesse faltar para fazer a cena parecer completamente natural, havia caçadores com seus arcos e flechas bem escondidos na montanha. (...) Era preciso um olhar aguçado para ver esses caçadores, tão escondidos estavam e tão cobertos com galhos e liquens das árvores, pois os animais de caça chegariam facilmente até os pés dos homens escondidos desta forma. Antes de atirar, esses caçadores faziam muitos gestos que atraíam a atenção do público, que de nada suspeitava." Friar Toribio Motolinía, History of the Indians of New Spain, ed. and trans. Elizabeth Andros, Berkeley, CA, Cortés Society, 1950, p. 102-103.

***As notas 20 – 21 não estão incluídas neste excerto.

[22]  Clifford Geertz, The Interpretation of Cultures, New York, Basic Books, 1973, p. 10.

[23]  Em espanhol, "el performance" em geral se refere a acontecimentos vindos dos negócios ou da política, enquanto o feminino "la performance" geralmente denota aqueles que vêm das artes. Agradeço a Marcela Fuentes por esta observação.

[24]  Michel de Certeau, The Writing of History, trans. Tom Conley, New York, Columbia University Press, 1988. p. xxv.

[25]  Em Colonial Encounters, por exemplo Peter Hulme discute a narrativa do encontro dentro da rubrica geral de "discurso colonial", acentuando assim os tropos e "práticas baseadas linguisticamente" que se originaram dele. Peter Hulme, Colonial Encounters: Europe and the Native Caribbean, 1492-1797, London, Rutledge, 1986, p. 2.

[26] Guy Debord, The Society of the Spectacle, Detroit, Black and Red, 1983, p. 4; Diana Taylor, Disappearing Acts: Spectacles of Gender and nationality in Argentina's Dirty War, Durham: Duke University Press, 1997, p. 119.



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